top of page
Buscar

LEITURA DELEITE: O boneco de piche

História da tradição oral recontada por ANA MARIA MACHADO.

Publicado no livro HISTÓRIAS À BRASILEIRA, Companhia das Letrinhas.



O BONECO DE PICHE


ERA UMA VEZ UMA MULHER que morava sozinha, numa casa pequenina, entre uma horta e um pomar, com uma mata por perto. O marido já tinha morrido havia muitos anos. Os filhos já tinham crescido e saído de casa, só de vez em quando vinham visitar e trazer os netos. Ela fazia todo o serviço da casa e cuidava da horta, do galinheiro e do jardim. E estava começando a se sentir cansada.


Nos fundos do quintal, a mulher tinha plantado várias bananeiras. Sempre tinha alguma dando fruta. Ela acompanhava, dia a dia, a flor linda da bananeira, as pétalas que caíam, as frutinhas bem miúdas e verdes começando a aparecer, depois crescendo devagar até virarem um cacho enorme cheio de pencas de bananas. Grandes e lindas, mas ainda verdes. Pesado demais para ela carregar.


Então ela esperava uma manhã em que o vizinho passassе em sua carroça a caminho da vila, para comprar alguma coisa na venda ou levar qualquer coisa ao mercado. Cumprimentava e pedia ajuda


O vizinho, que era amigo dela, cortava o cacho de bananas e deixava na varandinha dos fundos da casa. Durante o dia, ela dividia o cacho em várias pencas e depois arrumava tudo com cuidado num cesto para as bananas não baterem umas nas outras, não estragarem nem empedrarem (porque banana maçã empedra por dentro quando leva pancada, vocês sabiam?). Daí uns dois dias, quando o vizinho ia à vila outra vez, parava em frente à casa dela e perguntava:


- Tudo pronto, dona Maria?


Se as bananas já estivessem ficando de vez, começando a madurar, ela confirmava. Então, ele pegava o cesto e levava para vender. Na volta, trazia o dinheiro para ela e mais alguma coisinha que ela tivesse encomendado: sal, óleo, um pacote de macarrão.


Era sempre assim.


Até que apareceu o macaco Quer dizer, sempre apareciam macaquinhos por ali, porque a casa era perto de uma mata, como eu já disse. Mas uma vez apareceu um macaco um pouco maior e mais esperto, que era muito guloso e pegava as bananas ainda verdes, antes que a dona pudesse tirar do pé e preparar para vender. Ele ia lá, descascava a fruta, provava, via que estava verde e cheia de cica. Então jogava no chão pegava a do lado, fazia a mesma coisa. E depois o mesmo, com outra banana e mais outra. A mulher ficava furiosa. Tentava espantar o macaco com uma vassoura, gritava para ele ir embora, mas não adiantava. Ele ria, saía do alcance dela e ainda zombava:


- Você não me pega. Você não me pega!


Não pegava mesmo. Ele era ligeiro. E ela ficava no prejuízo. Tinha que pedir ao vizinho para tirar o cacho antes da hora. Rendia menos, e as frutas não ficavam tão gostosas.


Um dia, ela teve uma ideia. Voltou para casa repetindo:


- Não pego? Não pego? Não pego mesmo. Mas vou dar um jeito e ver o que te pega.


Pensou em fazer uma armadilha para ele. E teve a ideia de usar a coisa mais peguenta que conseguiu imaginar. Fez um boneco de piche de tamanho de um menino e botou de pé no quintal. Nos braços estendidos para a frente, o boneco segurava uma bandeja. Na bandeja, a mulher deixou um cacho de bananas maduras.


Daí a pouco, o macaco chegou ali e viu aquelas bananas amarelinhas, como ele nunca conseguia comer na bananeira. Mas viu que estavam com um menino, que tomava conta. Aproximou-se e pediu:


- Moleque, me dá uma banana...


O boneco nem se mexeu. O macaco insistiu:


- Moleque, me dá uma banana... por favor.


Não adiantou nada. O boneco continuou imóvel e calado. O macaco perdeu a paciência:


- Moleque, se você não me der uma banana, eu te dou um tapa...


E como o boneco não se mexeu mesmo, nem deu uma resposta, o macaco levantou o braço direito e tacou um tapa nele.


Ficou com a mão presa no piche, claro. Bem grudada, não soltava de jeito nenhum. Ai, ele pediu:


- Moleque, solta minha mão.


O boneco nem se mexeu. O macaco insistiu:


- Moleque, solta minha mão por favor.


Não adiantou nada. O boneco continuou imóvel e calado. O macaco perdeu a paciência:


- Moleque, se você não soltar minha mão, eu te dou outro tapa...


E como o boneco não se mexeu mesmo, nem deu uma resposta, o macaco levantou o braço esquerdo e tacou um tapa nele. Resultado: ficou com as duas mãos grudadas no piche. Não soltavam de jeito nenhum.


O macaco pediu, implorou... Não adiantou nada.


- Olha que eu te dou um chute... - ameaçou.


E como o boneco não se mexeu mesmo, nem deu uma resposta, o macaco tomou impulso com o pé direito e deu um chute nele. Ficou grudado e bem grudado, não adiantou gritar nem esbravejar. As duas mãos e o pé direito estavam presos no piche.


Mas não aprendeu. Ficou tão furioso, que fez tudo de novo.


- Moleque, solta minhas mãos e meu pé...


O boneco não soltou, e ele já foi ameaçando:


- Solta logo ou eu te dou outro chute... Você vai ver só...


Quem viu foi ele. O boneco não se mexeu, o macaco deu um chute nele com o pé esquerdo e ficou com esse pé também preso.


- Me solta, moleque, me solta! - gritava o macaco.


Lá de dentro da casa, a mulher olhava pela janela e dava risada. O macaco continuava:


- Me solta, moleque, ou eu te dou uma cabeçada!


O boneco não soltou. Furioso, o macaco deu uma marrada nele como se fosse um cabrito. E ficou com a cabeça presa. Só faltava uma coisa:


- Me solta de uma vez, seu moleque, ou vou te dar uma barrigada!


Teve que dar mesmo, porque o boneco não soltou. E o macaco ficou todo grudado, gritando, brigando e chorando. Mas não adiantou nada.


Passou a noite inteira assim. De manhã cedo, a mulher foi até lá e ficou com pena. Resolveu ajudar o macaco. Mas fez um trato:


- Vou aproveitar que o moleque está dormindo e te solto. E ainda te dou todas essas bananas maduras que estão na bandeja. Mas você tem que me prometer que nunca mais volta aqui. Porque se o moleque te pegar outra vez, eu não vou poder ajudar de novo.


O macaco prometeu. E cumpriu.


Comeu todas as bananas e foi-se embora. Para nunca mais voltar. E não é que a mulher até sentiu saudade dele de vez em quando? Era ladrão de banana, mas, afinal de contas, era um macaco muito engraçado.

 
 
 

Comments


Parceria Pedagógica

Rua Padre Aristides Greve

São Paulo - SP

CPF: 068.145.648-58

Telefone para contato: 11 98164-2216

Email para contato: parceriapedagogica@proton.me

Prazos:

Por se tratar de produtos digitais, a entrega é imediata, após confirmação do pagamento.

©2023 por Parceria Pedagógica. Orgulhosamente criado com Wix.com

bottom of page